Psicopedagogia - Saúde Mental

Psicopedagogo CLOVIS NEVES

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Eles Roubaram de Nós!

26/06/2011 05:00

Artigo publicado no Jornal O RIO BRANCO, coluna opinião.

*Clovis Neves

    Um dia desses, andando pela rua, eu vi à distância duas adolescentes. Elas vinham caminhando lado a lado, do jeito que todas as amigas sempre fizeram, mas algo havia de diferente: Não falavam entre si, não sorriam, não gesticulavam. Não mostravam nenhum dos trejeitos e expressões tão graciosas que as moças exibiam quando conversavam sobre meninos, ou roupas, ou outras coisas mais.

    Seus olhos vinham parados, perdidos em alguma distância abstrata. Neles não havia interesse pelo que estava em volta; não viam o caminho, as árvores, a calçada, as pessoas...

    Eram duas jovens saudáveis, caminhando com seus corpos físicos ali presentes, mas com suas mentes perdidas em algum lugar etéreo, muito longe dali...

    Cada uma delas falava em um telefone celular, que era segurado com a mão oposta ao lado que a menina estava. Suas cabeças estavam voltadas para os aparelhos, uma dando as costas à outra.

    Assim passaram por mim e sumiram na distância.

    Eu me pus a recordar como eram as minhas voltas para casa, depois da aula, em minha adolescência: caminhar, esperar o ônibus, sentar, observar a janela... Tudo em absoluto silêncio.

    É certo que por vezes eu estive ansioso para chegar, tirar o uniforme, encontrar os amigos da rua... Mas não havia nada que eu pudesse fazer para chegar mais rápido. Não estava ao meu alcance alterar o ritmo daquele percurso.

    Acostumei que, naquele momento do dia, eu tinha que me aquietar; e cotidianamente repetia aquela viagem em silêncio, apenas observando o que havia em volta...

    Hoje, recordo aqueles percursos onde “não havia nada para fazer” como alguns dos momentos mais gostosos de minha juventude. Pode parecer um contra- senso mas, talvez, a correria dos outros momentos tenha sido tão grande, que eu nem os tenha percebido passar. Na escola não havia um instante para respirar. Em casa havia os amigos, milhares de coisas para fazer, a televisão... talvez aqueles surrados percursos de ida e volta tinham sido os únicos instantes em que eu realmente estive comigo; e até hoje eu me lembro nitidamente de alguns dos pensamentos que ali me ocorreram.

    É claro que durante as viagens eu não tinha nada de “urgente” para dizer a ninguém. Mas se eu tivesse tido em mãos “artefato fantástico” como um “telefone celular”, com certeza “coisas urgentes” teriam surgido, e aqueles importantes momentos de que hoje me recordo, jamais teriam existido.

    É curioso como o tempo altera as coisas. Olhando para trás, descobrimos que quase tudo que imaginávamos “urgente” tinha na verdade pouca importância, e que algumas pequenas coisas pareciam “insignificantes” eram tudo o que realmente importava.

    Nós, humanos, parecemos ter uma inclinação para evitar esses momentos de introspecção, que são a vida, e buscarmos incessantes distrações: TV´S, CELULARES, COMPUTADORES, “COMUNICAÇÃO”...

    Não é irônico que toda essa “comunicação” acabe nos afastando de nós mesmos... das outras pessoas... e, em última instância do mundo?

    Passamos nossos dias em um turbilhão, na internet, conectados com os quatro cantos do mundo. Mas quando o dia termina temos a nítida sensação de que não fizemos absolutamente nada, e, acima de tudo, de que não vivemos.

    Devemos ter cuidado com os “fantásticos recursos” do mundo moderno. Pois a vida que existe em cada um de nós, não precisa deles, mas precisa absolutamente do tempo que eles roubaram de nós.

*Clovis Neves é Professor, Filósofo, Psicopedagogo, Pós-graduado em Saúde Mental e Especialista em TDAH - pela Universidade Católica de Brasília - DF.

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