Maria Fátima Vianna (Psicóloga)
Reinildes Oliveira (Pedagoga)
Clovis Neves (Psicopedagogo)
Sara Alexandra Freitas Fermino (Orientadora)
Resumo: Este estudo de caso não teve a pretensão de dar fórmulas ou receitas prontas a pais e professores, mas teve como principais objetivos investigar a dificuldade de aprendizagem de um aluno da 1º série do Ensino Fundamental, com 11 anos e levar os seus pais e professores a refletirem e a conhecerem os aspectos essenciais no processo ensino-aprendizagem de acordo com as propostas pedagógicas de Piaget, Vygotsky, Emília Ferreiro, Wallon e Leontiev. Entrevistas semi-estruturadas e lúdicas foram utilizadas como métodos qualitativos para o levantamento dos dados do estudo de caso, com o objetivo de investigar a causa da dificuldade de aprendizagem do sujeito do estudo de caso. As entrevistas semi-estruturadas foram realizadas com a famlia e a professora do aluno estudado e as entrevistas lúdicas de avaliação psicopedagógica dos aspectos afetivos, cognitivos e motores, com o aluno em questão. Constatou-se nesta pesquisa que também se pode resolver os problemas de aprendizagem através de atividades lúdicas, de condições adequadas para o exercício da cidadania e do envolvimento da famlia na escola e vice-versa. Durante a realização deste estudo de caso verificou-se que quando a criança se sente valorizada, sua auto-estima se eleva e isto favorece a aprendizagem. Assim, discutiu-se a forma de tratamento no que se refere dificuldade de aprendizagem tendo como parâmetro observação da criança no seu dia-a-dia.
Palavras-chave: Dificuldade de Aprendizagem. Proposta Pedagógica. Família. Estudo de Caso Psicopedagógico.
INTRODUÇÃO
É de suma importância o papel dos pais e dos professores no desenvolvimento de uma criança. Os professores devem conhecer o processo de aprendizagem, as diferentes manifestações nas faixas etárias (etapas do desenvolvimento) e também precisam saber como são seus alunos e suas famlias.
Por outro lado, a família também precisa interagir com a escola, tomar conhecimento das regras e funções da mesma, ter envolvimento na vida escolar do aluno. Por tanto, para que a criança se desenvolva bem, ela precisa de um ambiente afetivamente equilibrado onde os professores respeitem o seu grau de maturidade proporcionando-lhe uma aprendizagem significativa, e a família saiba conduzi-la e orientá-la para sair-se bem nas novas situações.
De acordo com Piaget (1967) e Wallon (1968), as interações sociais são importantes para que o conhecimento de si e do outro evolua de maneira solidária e interdependente:
"As aprendizagens ligadas a afetos, regras e valores sociais e o desenvolvimento da personalidade so influenciados diferentemente pelas trocas entre criança e adulto e entre as próprias crianças. O principal fator que impulsiona a criança a tomar consciência de si mesma e dos motivos que a guiaram o contato e, sobretudo, a oposição ao pensamento dos outros. A necessidade de controle e de demonstração não nasce espontaneamente no seio da vida individual; pelo contrário, um produto da vida social. À medida que a criança cresce, mais importante se torna a questão do grupo, tanto para a aprendizagem social como para o desenvolvimento da personalidade, pois ele favorece a aquisição de certas condutas; a tomada de consciência das próprias capacidades e sentimentos; o conhecimento objetivo de si por referência aos outros do grupo, a iniciação de práticas sociais, etc. (PIAGET, 1967, apud, SEBER, 1997, p.236)"
Partindo desse pressuposto este estudo de caso buscou, através de entrevistas semi-estruturadas, investigar junto com a família, professora e a direção da escola como estava sendo o processo ensino-aprendizagem do aluno em estudo levando em consideração os seus aspectos afetivos, motores e cognitivos envolvidos em sua aprendizagem e investigar a origem de sua dificuldade de aprendizagem.
A avaliação psicopedagógica destes três aspectos se deu durante as atividades diárias com o aluno. Através dela percebeu-se que esta criança demonstrava dificuldades para dar e receber carinho (aspecto afetivo), tinha domínio corporal e flexibilidade (aspecto motor) e que estava desmotivado para aprender (aspecto cognitivo). Esta avaliação serviu para se conhecer o aluno e através deste conhecimento, dar oportunidade a ele para se expressar livremente, inventar brincadeiras, fazer desenhos livres e dar respostas criativas.
Durante a pesquisa de estudo de caso com esta criança, o processo de ensino aprendizagem para alfabetização foi organizado de modo que a leitura e a escrita foram desenvolvidas por intermédio de uma linguagem real, natural, significativa e vivenciada. A assimilação do código linguístico não foi uma atividade de mãos e dedos, mas sim, uma atividade de pensamento, uma forma complexa de construção de relações.
A partir de estudos de Piaget, Vygotsky, Emília Ferreiro, Wallon e Leontiev desenvolveu-se a linguagem escrita significativa e não a escrita das letras sem sentido que tinha como objetivo fazer cópias.
Para a realização efetiva deste estudo foram utilizados jogos e atividades lúdicas para facilitarem a aprendizagem do aluno em questão.
Segundo Vygotsky:
"Na aprendizagem quando observamos o curso do desenvolvimento da criança durante a idade escolar e no curso de sua instrução, vemos que na realidade qualquer matéria exige da criança mais do que esta pode dar nesse momento, isto, que esta realiza na escola uma atividade que lhe obriga a superar-se. Isto se refere sempre a instrução escolar sadia. Começa-se a ensinar a criança a escrever quando todavia não possui todas as funções que asseguram a linguagem escrita. Precisamente por isso, o ensino da linguagem escrita provoca e implica o desenvolvimento dessas funções. Esta situação real se produz sempre que a instrução fecunda. Ensinar a uma criança aquilo que é incapaz de aprender é tão inútil como ensinar-lhe a fazer o que é capaz de realizar por si mesma. (VYGOTSKY, apud DUARTE, 1996, p.97)"
Nesta pesquisa mostra-se que a colaboração dos pais ou responsáveis foi fundamental. Não que o processo somente com a criança e o professor não possa avançar, mas, sem dúvida, a colaboração da família aumenta as chances de um bom aproveitamento escolar.
De acordo Wallon (1979):
"A família, o grupo natural onde a criança realiza a aprendizagem inicial de certas relações e sentimentos sociais. Medida que a criança se desenvolve e vai para a escola, a possibilidade de constituição de grupos se diversifica. Durável ou não, todo grupo tem objetivos definidos que orientam sua formação. Pertencer a um grupo significa ultrapassar as relações puramente subjetivas de pessoa para pessoa. Para isso são importantes filiação ao conjunto dos seus membros, dos interesses e aspirações de todos; entrada na sua estrutura, isto, ocupar determinado lugar, desempenhar certo papel, aceitar os seus membros como árbitros, harmonização da própria atividade com os fins do grupo, acatar aceitação ou recusa de certas atitudes suas por parte dos membros do grupo, etc. Considerando todos esses aspectos, só com aproximadamente 6 ou 7 anos, as crianças têm condições intelectuais de procurar para si um lugar num grupo, não exclusivamente voltado para jogos, como até então. Elas se tornam aptas a combinar de modo cooperativo o que pretendiam realizar. (Wallon,1979, p. 172)"
A opinião, o sentimento que cada pessoa tem por si mesma, a capacidade de respeitar, confiar e gostar de si são pré requisitos para que se possa ter um bom desenvolvimento pessoal e uma elevada auto-estima.
METODOLOGIA
A pesquisa realizada foi baseada em um estudo de caso sobre a dificuldade de aprendizagem de um aluno da 1ª série do ensino fundamental e teve como embasamento teórico os autores Piaget, Vygotsky, Emília Ferreiro, Wallon e Leontiev, sendo que a proposta pedagógica mais utilizada foi a de Emília Ferreiro por estar em conformidade com o processo de alfabetização mais usado atualmente.
Constatou-se que através de atividades lúdicas, de condições adequadas para o exercício da cidadania e do envolvimento da família na escola e vice-versa, também se pode resolver os problemas de aprendizagem.
O papel dos pais e dos professores é extremamente importante no desenvolvimento de uma criança. Os professores devem conhecer os processos de aprendizagem e as etapas do desenvolvimento. A família, por sua vez, precisa interagir com a escola e ter envolvimento na vida escolar do aluno.
Esta pesquisa de estudo de caso visou integrar as teorias da aprendizagem da psicopedagogia com intenção de ampliar, na criança, o desenvolvimento possibilitando uma melhor adaptação para a vida e proporcionando-lhe a prática da leitura e da escrita.
Para a realização deste estudo de caso foram feitas entrevistas semi-estruturadas com a famlia, com a direção da escola e com a professora da criança e, também, com o próprio aluno para conhecermos a sua trajetória de vida. Após as entrevistas, foi dado início a esta pesquisa a partir dos estudos de Piaget, Vygotsky, Emília Ferreiro, Wallon e Leontiev compreendendo assim como se dá o processo de alfabetização.
Durante a investigação das dificuldades de aprendizagem do aluno, foram realizadas avaliações psicopedagógicas para análise dos aspectos afetivos, cognitivos e motores. Para isso, foram dadas oportunidades à criança para se expressar emocionalmente, falar da sua vida, de sua família e de seus amigos.Também lhe foi permitido o contato com livros infantis, revistas, jornais e outros objetos onde continham linguagem escrita. Analisou-se a influência do desenvolvimento motor na aprendizagem através de algumas atividades práticas como pular corda, jogo da amarelinha, saltar em um pé só, jogos com bola, entre outros. Com isso observou-se que o aluno no apresentava dificuldade motora.
Estas atividades foram realizadas na residência de um dos componentes da equipe deste estudo de caso onde o ambiente era propício à aprendizagem pois não havia movimento na casa. O local era claro, arejado e silencioso. A preocupação em se desenvolver a linguagem escrita e não a escrita das letras era uma constante. Enquanto a criança brincava e aprendia interagindo, vivenciando e participando do momento educacional, ela também trabalhava o seu desenvolvimento cognitivo, social e afetivo.
Neste mesmo local foram realizadas as reuniões com o tio e a diretora do aluno. A professora também foi convidada, porém não compareceu. Nestas reuniões o aluno no participava. As entrevistas foram feitas na própria escola do aluno e todos (tio, diretora, professora, aluno) participaram individualmente dando seus depoimentos.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Este estudo foi realizado com um aluno de 11 anos, estudante de escola pública, repetente da 1ª série e inserido na classe de aceleração. Não conviveu com os pais e morava com os tios e primos. Ele não teve referência de família nuclear (pai, mãe e irmãos), e sua maior dificuldade na escola era com a alfabetização e o raciocínio lógico matemático.
Antes de iniciar a pesquisa de estudo de caso com este aluno, foram feitas entrevistas/anamneses com o tio e a professora do sujeito.
Esta pesquisa de estudo de caso foi realizada com a participaçãoo do tio do aluno, pois a mãe desta criança viajou para fora do país deixando seu filho, ainda em fase pré-escolar, aos cuidados deste tio. Ela fixou residência na Europa e só se comunicava com esta criança, periodicamente, por telefone.
Durante as entrevistas, percebeu-se que a professora atribuía a dificuldade de aprendizagem desse aluno à falta de interesse e participação da família na escola.
Já em entrevista com o tio, ele afirma ter feito tudo o que podia por este garoto, e que não participou das reuniões e chamados da escola, por falta de tempo. Segundo ele, a dificuldade na aprendizagem foi desencadeada pelo desprezo da mãe.
E nesse jogo de empurra-empurra, nada saudável, o único prejudicado foi o aluno. Durante uma conversa informal com ele, constatou-se o seu descaso pela escola e por assuntos referentes a ela. Demonstrou dificuldades para dar e receber carinhos e deixou nítida a saudade que sente da mãe.
Através das atividades práticas de avaliação do desenvolvimento motor percebeu-se que o aluno não tinha dificuldade motora nem de domínio corporal. Porém, notou-se que através de desenhos da figura humana, ele demonstrou não ter estruturação do esquema corporal. Durante a realização deste estudo de caso, estes desenhos foram evoluindo e o aluno teve a noção das partes do corpo que são necessárias para compor uma figura humana.
Neto (2002), afirma que:
"Os primeiros contatos corporais que a criança percebe, manipula e com os quais joga são de seu próprio corpo satisfação e dor, choro e alegria, mobilizações e deslocamentos, sensações visuais e auditivas e esse corpo é o meio da ação, do conhecimento e da relação. A construção do esquema corporal, isto é, a organização das sensações relativas a seu próprio corpo em associação com os dados do mundo exterior exerce um papel fundamental no desenvolvimento da criança, já que essa organização é o ponto de partida de suas diversas possibilidades de ação. Sendo assim, esquema corporal é a organização das sensações relativas a seu próprio corpo em associação com os dados do mundo exterior. (NETO, 2002, p.20)"
E Leontiev (1989) ao analisar a brincadeira como a principal atividade geradora do desenvolvimento psíquico da criança na idade escolar, afirma que:
"O papel dominante da brincadeira na idade pré-escolar é reconhecido praticamente por todos, mas para dominar o processo do desenvolvimento psíquico da criança nesse estágio, quando a brincadeira desempenha o papel dominante, não é certamente suficiente apenas reconhecer este papel da atividade lúdica. É necessário compreender claramente em que consiste o papel capital das brincadeiras; as regras do jogo e seu desenvolvimento precisam ser apresentados. O desenvolvimento mental de uma criança conscientemente regulado sobre tudo pelo controle de sua relação precípua e dominante com a realidade, pelo controle de sua atividade principal. (LEONTIEV, 198apud, DUARTE, 1996, p.104)."
Ainda durante a entrevista com o tio do sujeito, sentiu-se a sua preocupação em buscar alguém que pudesse ajudá-lo, visto a sua falta de tempo. O objetivo dessa ajuda era recuperar o tempo perdido, pois as dificuldades de aprendizagem estavam se acumulando e o tio não sabia o que fazer para ajudá-lo.
Ao analisar-se o caderno escolar que esse aluno estava trabalhando percebeu-se como normalmente o alfabetizador desenvolve seu trabalho sem saber o que vem a ser o processo de aquisição da linguagem escrita, e considera sua tarefa cumprida quando termina o conteúdo. Para esses alfabetizadores, ler é sinônimo de decodificar; e escrever, de copiar. E era isso o que estava acontecendo com o aluno em questão.
Sabe-se que toda a aprendizagem da criança na escola tem uma trajetória, isto, a criança antes de ir escola já teve conhecimento de matemática e de linguagem através de experiências no seu dia-a-dia. Assim, através da interação com outras pessoas, adultas ou crianças, que se constrói as características próprias de cada indivíduo, modo de agir, pensar, sentir e também sua visão de mundo, o seu conhecimento.
Piaget, (1967) defende a hipótese de que a aprendizagem se consolida mediante a possibilidade de a criança generalizar o que aprendeu para outras situações. Quando essa generalização não acontece, vale questionar se houve ou não aprendizagem.
De acordo com o autor, o primeiro passo no desenvolvimento desse estudo foi fazer uma sondagem para ver em qual etapa de alfabetização o sujeito estudado encontrava-se.
Ferreiro (2001) afirma que:
"Os indicadores mais claros das explorações que as crianças realizam para compreender a natureza da escrita são suas produções espontâneas, entendendo como tal as que não são o resultado de uma cópia. Quando uma criança escreve tal como acredita que poderia ou deveria escrever, certo conjunto de palavras, está nos oferecendo um valiossísimo documento que necessita ser interpretado para poder ser avaliado. (FERREIRO, 2001, p.16)"
Ainda de conformidade com Ferreiro (2001):
"Para compreender o desenvolvimento do sistema representativo da escrita do ponto de vista dos processos de apropriação, essencial procurar identificar como a criança passa de um nível de conhecimento para outros níveis mais amplos. Cada nível caracterizado por um modo de organização, em razão do qual a criança interpreta o que consegue assimilar a partir das suas experiências. O resultado é uma formulação e reformulação de hipóteses, isto é, maneiras particulares de a criança realizar e explicar o que escreve. Nas sucessivas etapas dessa aprendizagem, ela vai substituindo suas hipóteses na medida em que compreende, mais e mais, o sistema de escrita. (FERREIRO, 2001, p.19)"
Escrever e ler envolve um processo contínuo de construção e reconstrução do código linguístico usado pelo adulto. Foi assim que efetuou-se todo o estudo com este aluno.
A partir do seu campo de interesse, os carros, ele pesquisou, recortou, colou figuras de acessórios de carros e escreveu construindo as palavras correspondentes aos recortes.
Foi utilizado também, o método de Paulo Freire que consiste na construção de palavras a partir de combinações silábicas dentro de um significado.
Em seguida, construiu frases e, depois, pequenos textos sempre respeitando sua formulação de hipóteses e seu campo de interesse. Trabalhou-se assim com a linguagem e com a matemática.
Através de jogos, motivou-se a aprendizagem. Eles eram usados na hora certa, respeitando a maturidade e o interesse do aluno.
Não eram muito difíceis para causar cansaço, e nem tão fáceis para evitar o tédio.
O jogo está presente no cotidiano da criança que desenha, canta, rima, representa, chuta a bola ou pula corda. Na verdade, para a criança quase toda atividade é jogo, e é por meio do jogo que ela constrói grande parte do seu conhecimento. Quando isso acontece, a situação ensino aprendizagem fica caracterizada pelo aspecto lúdico e prazeroso em que o erro passa a ser aceito naturalmente e a interação com o outro espontânea. Por meio do jogo, do fazer, do brincar, do representar, a criança experimenta ir além, ultrapassa seus próprios limites, adquirindo autonomia na aprendizagem.
Na sala de aula desse aluno não havia materiais que estimulassem sua curiosidade a respeito da escrita e da leitura. Portanto, desenvolveu-se um espaço estimulador que favoreceu o contato da criança com material escrito. Colocou-se a disposição do aluno, vários livros, jornais, gibis, revistas, etc. O registro e a leitura de tudo o que foi possvel em atividades desenvolvidas pela criança, como listagens de nomes e palavras, letras do alfabeto, frases, textos, palavras cruzadas, caça-palavras, entre outros, passaram a ser elementos de investigação cotidiana.
Infelizmente ainda se encontra em algumas escolas a seguinte realidade, conforme afirma Ferreiro (2001):
"Temos uma imagem empobrecida da língua escrita, é preciso reintroduzir, quando consideramos a alfabetizao, a escrita como sistema de representação da linguagem. Temos uma imagem empobrecida da criança que aprende e a reduzimos a um par de olhos, um par de ouvidos, uma mão que pega um instrumento para marcar e um aparelho fonador que emite sons. Através disso há um sujeito cognoscente, alguém que pensa, que constrói interpretações, que age sobre o real para fazê-lo seu. (FERREIRO, 2001, p.40)"
A maior preocupao durante este estudo foi dar oportunidade e oferecer ocasiões para a criança aprender, diminuindo assim sua dificuldade de aprendizagem. Assim, construindo formas e combinações, tentando produzir e criar uma representação adequada para uma ou várias palavras, o aluno aprendeu melhor do que se estivesse fazendo cópias. Aqui destacou-se a importância de a criança manipular objetos para que possa compreender, em pensamento, o que as mãos permitem apreender diretamente.
A aprendizagem é possível somente quando há assimilação ativa por parte da criança. Segundo Vygotsky (1989):
"Até agora, a escrita ocupou um lugar muito estreito na prática escolar, em relação ao papel fundamental que ela desempenha no desenvolvimento cultural da criança. Ensinamos a criança a desenhar letras e construir palavras com elas, mas não ensinamos a linguagem escrita. Enfatizamos de tal forma a mecânica de ler o que está escrito, que acabamos obscurecendo a linguagem escrita como tal. (VYGOTSKY, 1989, p.119)"
Através de jogos, sondagens, análises e brincadeiras, que aconteceram durante as entrevistas lúdicas com o aluno estudado, e também através das entrevistas lúdicas de avaliação psicopedagógicas dos aspectos afetivos, cognitivos e motores envolvidos na aprendizagem do aluno, conseguiu-se descobrir o motivo da dificuldade de aprendizagem do mesmo que foi a falta de um ambiente afetivamente equilibrado onde ele pudesse receber amor autêntico. A inadequação do ambiente escolar era a falta de compreensão da professora e em casa, era a falta do carinho materno. Baseado nesses dados procurou-se melhorar as condições do seu processo de ensino-aprendizagem, realizando-se várias atividades lúdicas e alternativas para o ensino da leitura e da escrita das palavras.
Primeiro mostrou-se ao aluno em questão a importância da escola, dos amigos e do seu entrosamento com os professores, coordenadores, diretores, pessoal da limpeza, enfim todos os que compõem o quadro de funcionários da escola. Falou-se também sobre as regras que se devem seguir na escola, em casa, e em todos os lugares. Regras são importantes para que haja organização.
Ensinou-se ao aluno a estudar. Procurar um local calmo e silencioso, onde haja limpeza e ordem. Procurar se concentrar e não estudar com rádio ou televisão ligados. Na escola, procurar fazer as atividades com boa vontade colaborando com a professora.
Se tiver dúvida, pergunte. Não fuja do problema, enfrente-o. Confie na sua professora. Ela é sua amiga e está ali para ensiná-lo.
Quando trabalha-se com boa vontade, tudo fica mais fácil e mais gostoso.
Nas reuniões que foram realizadas com o tio, foi pedido que ele o incentivasse e o elogiasse. Que o ajudasse na organização da sua mochila. Que o colocasse mais cedo na cama para não ficar com sono durante a aula e que viesse buscá-lo no horário combinado para evitar a sensação de abandono que este aluno sente.
Também pediu-se que valorizasse a escola e a professora para que o aluno sentisse mais segurança e confiança no ambiente escolar. Explicou-se que a escola e a família devem ser parceiros na aprendizagem.
Apresentou-se ao tio, o rendimento do aluno estudado quanto a sua aprendizagem e dedicação. Convidou-se a professora e a diretora para participarem das reuniões. Porém, só vieram o tio e a diretora da escola. Pediu-se uma avaliao neurológica e oftalmológica. Porém, só foi feita a consulta com o oftalmologista, nada constando de problema visual.
Após mostrar a importncia da família para o desenvolvimento de uma criança, também falou-se ao tio sobre o valor da auto-estima na educação. A opinião, o sentimento que cada pessoa tem por si mesma, a capacidade de respeitar, confiar e gostar de sí são pré requisitos para que se possa ter um bom desenvolvimento pessoal.
Durante a investigação da dificuldade de aprendizagem do aspecto cognitivo do aluno estudado, foram realizadas muitas atividades lúdicas, para que este aluno pudesse nos mostrar em qual nível de aprendizagem se encontrava no momento.
Para trabalhar o desenvolvimento cognitivo, social e afetivo, foram confeccionados jogos para facilitar a aprendizagem do aluno estudado. Nessas figuras pode-se observar alguns dos jogos utilizados no desenvolvimento do aspecto cognitivo. Realizaram-se as atividades como o Bingo de palavras (figura 1 e 2) para estimular o reconhecimento das letras do alfabeto; e caixa de letras usada na estimulação da construção de palavras (figura 3 ).
Para realizar a atividade de avaliação do aspecto cognitivo envolvido na aprendizagem do aluno, conforme nos mostra a figura 1 e 2, foram feitas perguntas de adivinhações cujas respostas deveriam ser encontradas nas cartelas do bingo. Já na figura 3 a criança construía palavras montadas através de pequenas placas com letras. Em todos estes jogos a criança reagiu com entusiasmo e interesse.
Ainda no aspecto cognitivo, trabalhou-se a construção de palavras com a caixa ilustrada (figura 4), método Paulo Freire (figura 5) e jogo da memória (figura 6).
Na figura 4, dentro das caixas ilustradas continham as letras das palavras correspondentes aos desenhos da caixa. A criança deveria desembaralhá-las e organizá-las construindo a palavra correspondente.
Na figura 5, através do método Paulo Freire, a criança deveria construir outras palavras a partir de combinações silábicas.
Já no jogo da memória (figura 6) o aluno deveria formar os pares das fichas comparando figuras com palavras.
A criança gostava de trabalhar com esses jogos pois, para ela, isto era um motivo de desafio.
Para trabalhar com a matemática foram oferecidos ao aluno vários jogos de contas associando número à quantidade (figura 7).
Para estimular o raciocínio lógico foram utilizados jogos de correspondência de números com quantidades, colar de contas onde fazia adição e subtração e também aprendeu a ver as horas no relógio. Conforme a figura 7 nos mostra, o aluno se interou da percepção do tempo e do espaço.
No início de cada encontro conversava-se com ele sobre como estava emocionalmente e a partir do seu estado de espírito, mantinha-se um diálogo para elevar sua auto-estima e para ele conseguir se entender e se aceitar. Também foi mostrada a importância da escola, dos amigos e do seu entrosamento com os professores e pessoal de apoio da escola.
Ensinou-se o aluno a estudar e se organizar, a seguir as regras da escola e da casa, e a colaborar com a professora ao fazer suas atividades.
Nas reuniões que foram realizadas com o tio, foi pedido que ele incentivasse e elogiasse o sujeito. Que o ajudasse na organização dos materiais escolares que o colocasse mais cedo para dormir e que viesse buscá-lo no horário combinado para no causar desconforto e evitar a sensação de abandono que ele sentia quando isso acontecia.
Também pediu-se que valorizasse a escola e a professora para que o aluno sentisse mais segurana e confiança no ambiente escolar. Explicou-se que a escola e a família devem ser parceiras na aprendizagem. Essa parceria eleva a auto-estima e faz com que o aluno valorize a educação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo de caso realizado com este aluno não se resumiu apenas a ler e a escrever e nem tão pouco a fazer continhas de matemática. O objetivo maior era fazer com que ele se tornasse um ser pensante, que tivesse vontade própria e se sentisse igual e valorizado como todos os que com ele convivem.
Outro objetivo era o de provar que existe maior probabilidade de envolvimento da família, quando os educadores incentivam e auxiliam os pais na missão de ajudar seus filhos em suas tarefas escolares, o que nos mostrou ser uma grande aliada na amenização da dificuldade de aprendizagem do aluno estudado.
O envolvimento familiar, uma boa educação escolar e o desenvolvimento das habilidades de leitura e de redação são essenciais para se manter uma aprendizagem com sucesso.
No final do estudo de caso, o aluno sentia-se mais confiante e feliz, e sua auto-estima estava mais elevada. Em pouco tempo ele conseguiu realizar seu grande sonho, que era saber ler e escrever.
Através de entrevistas com o tio, ficou claro que este entendeu a importância da família estar envolvida com a escola. O aluno estava mais participativo e as avaliações psicopedagógicas dos aspectos cognitivos, afetivos e motores fizeram-no perceber a importância da aprendizagem. O seu raciocínio ficou mais coerente e sua conduta se modificou, pois ele estava mais sociável.
Cabe, no entanto, indagar porque ainda hoje existem professores que insistem em ensinar de maneira tradicional, ultrapassada e desmotivadora para o aluno e qual o motivo da resistência ao novo. Será a falta de formação profissional? Ou a falta de formação continuada para professores? Quem saiba estes sejam questionamentos para mais uma pesquisa.
Por que ao invés disso, os professores não refletem sobre seus conceitos buscando transformar o processo educativo numa significação mais profunda para a vida, levando em consideração a inteligência emocional do educando?
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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